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quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

quem diz macacos
me mordam
deve atentar que essa frase
de infância chama os espíritos
dos macacos, que, por sua vez,
chamam os macacos vivos
o butantã, lar do famoso serpentário,
corre o risco de ser invadido
por um exército de macacos
doidos pra morder
o atrevido

ii

tem os dentes
fossilizados
e tem aqueles
desfeitos erosão
pela memória

cuidado

iii

tem os dentes
da caveira
e tem aqueles
sorrindo na foto
do meu pai

são os mesmos

dos dentes se aprende
(que é que eu aprendo?)
mastigo um pedaço
de queijo no almoço

tudo o que eu mastigo está morto

iv

dos dentes se aprende
quem caça sem dúvida
sobrevivência garantida
pelo bote da mandíbula

meus avós guardam na pia
numa caneca quebrada
fazem poupança com a aposentadoria
mas já não esperam mais nada

v

nestes tempos de epidemia
não conte com a antropofagia

nestes tempos de contaminação
não confie só na digestão

nestes tempos de sobreaviso
não morda nem seu amigo

vi

nestes tempos autoimunes
os galhos tremem
os micos têm medo
e fome, mas só ficam assistindo

o bairro espera
o novo ataque
treme à espreita
das suas feras

são outros dentes que mordem
o interior das bochechas

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