vivemos
a era do plástico
em vez da do bronze
ou do ouro
ou do ferro
o cachorro
morde a bola de plástico
o estômago
da baleia cheio de plástico
sonhei
uma vez que comia
uma salada de frascos de plástico
mas quando pressinto
lipodistrofia
na nádega magra
na cadeira dura
acho que vivemos
ainda
a era do nervo
a era do osso
sábado, 30 de novembro de 2013
quinta-feira, 28 de novembro de 2013
sábado, 19 de outubro de 2013
domingo, 25 de agosto de 2013
todos os outros seres vivos
a mesa
conversa com a árvore
que ela foi
na minha cabeça
e a terra
que fez os tijolos
da parede logo à frente
conversa com as mãos
dos pedreiros que já morreram
e todos os outros seres vivos
que voltaram a ela
hoje emparedados
e servindo de suporte
a quem tem parede
e mesa
vivo
.
tanto quanto o cachorro que late
a quem demos um nome
a gente olha o que tem na pata
temendo que seja um tumor
que mate o nosso nome
tanto quanto o mosquito
que eu mato por reflexo
antes do dedo assassino
na tela ele estava vivo
tanto quanto as estatísticas
de todos os outros seres vivos
e os primatas que mês passado descobriram
na colômbia
classificamos os olhos
estabelecemos parentesco
entre os cachorros, os macacos,
os mosquitos e nós mesmos
.
tanto quanto a mãe
que recebeu muitas designações
nos últimos milênios de impasse
e segue existindo como se isso
não importasse
tanto quanto o pai
igual igual igual
só que ele já morreu
volte à estrofe nº 1
quinta-feira, 27 de junho de 2013
ainda bem que meu corpo não é eu
o colchão quebrado pelo sono
se embanana em dedos deus me livre
as pernas nessa insônia igual
à minha, caminhariam a noite
inteira em círculos
os outros
pedaços do corpo também podiam
passar em claro agito no cansaço:
uma unha choraminga solidão
os testículos se pensando tristes
nariz ansioso guardando
o que cheirar no dia seguinte
ainda bem que meu corpo
não atende pelo nome
a letra acorda meu nome pra sempre
logo logo meu corpo some
ainda bem que minha noite
é no mínimo do meridiano
meu corpo é só mais um entre muitos
meu nome é quem conta os anos
se embanana em dedos deus me livre
as pernas nessa insônia igual
à minha, caminhariam a noite
inteira em círculos
os outros
pedaços do corpo também podiam
passar em claro agito no cansaço:
uma unha choraminga solidão
os testículos se pensando tristes
nariz ansioso guardando
o que cheirar no dia seguinte
ainda bem que meu corpo
não atende pelo nome
a letra acorda meu nome pra sempre
logo logo meu corpo some
ainda bem que minha noite
é no mínimo do meridiano
meu corpo é só mais um entre muitos
meu nome é quem conta os anos
sábado, 22 de junho de 2013
O melhor amigo de Deus
1
igual cachorro
que anda sem dono
o dono logo atrás
atropelaram Deus
corri de susto
e agora
não sei voltar pra casa
2
rasgo
os sacos de restos da feira
durmo no chão ao relento
o treinador me ensina: cachorro
é sobrevivência
3
encontro a porta amiga
fechada as chaves de Deus em seu bolso
no Instituto Médico Legal, logo sepulto
espero à porta
pra sempre
até que um passante com dó
me adote
igual cachorro
que anda sem dono
o dono logo atrás
atropelaram Deus
corri de susto
e agora
não sei voltar pra casa
2
rasgo
os sacos de restos da feira
durmo no chão ao relento
o treinador me ensina: cachorro
é sobrevivência
3
encontro a porta amiga
fechada as chaves de Deus em seu bolso
no Instituto Médico Legal, logo sepulto
espero à porta
pra sempre
até que um passante com dó
me adote
terça-feira, 7 de maio de 2013
tudo por fazer
tomar
os dias de canudinho, um ônibus
pra ontem, cada parada muda o cenário,
abrir a cidade uma trilha na foice
tatuar todo o meu braço ou morrer
sem precisar, amor a fórceps,
conta no banco
deixar
a viagem na mesa, o presente
ganhado no último aniversário um projeto de livro
pro ano da copa
pro peixe na rede
perder a palavra
o infinitivo é um tempo púlpito
os dias de canudinho, um ônibus
pra ontem, cada parada muda o cenário,
abrir a cidade uma trilha na foice
tatuar todo o meu braço ou morrer
sem precisar, amor a fórceps,
conta no banco
deixar
a viagem na mesa, o presente
ganhado no último aniversário um projeto de livro
pro ano da copa
pro peixe na rede
perder a palavra
o infinitivo é um tempo púlpito
terça-feira, 16 de abril de 2013
aspiro ao grande labirinto
Abarrotam as pessoas
no caminho pretendido de manhã
ao fim da tarde as ruas
arrastadas pelo olhar se esquecem
e cansam o dia seguinte
meu corpo ocupa um espaço
eu alcanço se não penso
ele não chega às avenidas
que o céu abre na cabeça
aspiro ao grande labirinto
panorâmico, adoeço
no caminho pretendido de manhã
ao fim da tarde as ruas
arrastadas pelo olhar se esquecem
e cansam o dia seguinte
meu corpo ocupa um espaço
eu alcanço se não penso
ele não chega às avenidas
que o céu abre na cabeça
aspiro ao grande labirinto
panorâmico, adoeço
quinta-feira, 11 de abril de 2013
terça-feira, 2 de abril de 2013
quantos mosquitos você já matou hoje
é fácil
matar o menor
1. se o vemos
2. se o alcançamos
3. se ele não nos alcança primeiro
é óbvio
não é o mesmo
matar um pernilongo
um vírus
um escorpião
o mesmo se aplica
a matar o maior
(repita a argumentação
pontos 1, 2 e 3)
um pai
um paquiderme
um planeta
matar o menor
1. se o vemos
2. se o alcançamos
3. se ele não nos alcança primeiro
é óbvio
não é o mesmo
matar um pernilongo
um vírus
um escorpião
o mesmo se aplica
a matar o maior
(repita a argumentação
pontos 1, 2 e 3)
um pai
um paquiderme
um planeta
domingo, 24 de março de 2013
educação sentimental
minha mãe acha que beijo é troca
de micróbios portanto não devíamos
a menos que casássemos com quem
do sexo oposto não nos desse
DSTs cornos talvez tapas no rosto
meu vô fratura o úmero
tenho que buscar
no google descubro
é o osso do braço
dele que herdei
obsessão com a morte
mas cai e não morre
e quando ocorre não liga
nem pra saber se está bem
de micróbios portanto não devíamos
a menos que casássemos com quem
do sexo oposto não nos desse
DSTs cornos talvez tapas no rosto
meu vô fratura o úmero
tenho que buscar
no google descubro
é o osso do braço
dele que herdei
obsessão com a morte
mas cai e não morre
e quando ocorre não liga
nem pra saber se está bem
depois do diário
i
amarram essas paredes com uma vontade bem firme
e olha só elas estão bambas
ii
a terapia dos cadernos acumula pó debaixo da cama
lá também vive o monstro que escrevia
iii
depois dos diários deixamos de enviar notícia
o mundo é grande, qualquer um encontra
iv
gaiola não canta
amarram essas paredes com uma vontade bem firme
e olha só elas estão bambas
ii
a terapia dos cadernos acumula pó debaixo da cama
lá também vive o monstro que escrevia
iii
depois dos diários deixamos de enviar notícia
o mundo é grande, qualquer um encontra
iv
gaiola não canta
sexta-feira, 15 de março de 2013
abraço um cachorro entupido nas tubas oculares
ele morde as nervuras de uma neblina
que não pode ser avisada
meu cão-guia só tem dentes e deixa
para mim as patas de tropeço, amordaço
nos óculos quebrados os conceitos
as esperas se embaçam
abraço um afeto que me morde
com dentes afiados de filhote
afeto difuso antes dos dentes
o corpo sangra, coça, arde
sobretudo ele incomoda
a neblina que o envolve
abraço essa fumaça
ela vaza do meu abraço
*
hieroglifos nos papéis do asfalto são
uivos noturnos o perigo na floresta
amanhece e a névoa cobre o capim baixo
sobre o lago que não vemos
periga cair e se afogar
periga que um lobo ou um jaguar
os primatas que nasciam cegos
eram deixados para trás
no próprio azar
ele morde as nervuras de uma neblina
que não pode ser avisada
meu cão-guia só tem dentes e deixa
para mim as patas de tropeço, amordaço
nos óculos quebrados os conceitos
as esperas se embaçam
abraço um afeto que me morde
com dentes afiados de filhote
afeto difuso antes dos dentes
o corpo sangra, coça, arde
sobretudo ele incomoda
a neblina que o envolve
abraço essa fumaça
ela vaza do meu abraço
*
hieroglifos nos papéis do asfalto são
uivos noturnos o perigo na floresta
amanhece e a névoa cobre o capim baixo
sobre o lago que não vemos
periga cair e se afogar
periga que um lobo ou um jaguar
os primatas que nasciam cegos
eram deixados para trás
no próprio azar
quinta-feira, 14 de março de 2013
domingo, 3 de março de 2013
"não podes, sozinho, dinamitar"
a página do jornal na internet
informa
que todo dia cai um viaduto
embora informe
"viaduto caiu em"
acrescente a cidade que você imaginar
hoje foi em calcutá
troque viaduto por prédio
subtraia as razões da queda
que podem ser improbidade administrativa
ação de grupos extremistas
catástrofes naturais
ou qualquer outra expressão
entre as mais lindas da língua portuguesa
subtraia as histórias dos mortos
principalmente se continuam vivos
as fotos mostram os escombros
e o corpo dos bombeiros bem servido
de fardas e esforços pra ajudar a humanidade
subtraia a granola
que eu como com leite enquanto leio
a notícia de tragédia
já fomos melhores em tragédia
houve um tempo em que se arrancavam os olhos
e os corvos comiam teu fígado
até o fim da eternidade
se você ousasse trazer o fogo
pros outros
agora comemora
a ocupação militar em favelas
no rio de janeiro junto às pedras
mudas do viaduto de calcutá
um desconto no carro zero
não que eu seja saudosista
de um tempo mítico desconhecido
desde o começo dos tempos, dizem,
cai um viaduto por dia
no mundo
passo o café pensando nos indianos
e na ocupação militar das favelas
e tentando esquecer do carro
zero
passo o café pensando
em pôr bombas nas redações
dos grupos empresariais
que se entrincheiram nos maiores jornais
comerciais do país
pra que a notícia caia na boca
do povo:
todo dia cai um poderoso
informa
que todo dia cai um viaduto
embora informe
"viaduto caiu em"
acrescente a cidade que você imaginar
hoje foi em calcutá
troque viaduto por prédio
subtraia as razões da queda
que podem ser improbidade administrativa
ação de grupos extremistas
catástrofes naturais
ou qualquer outra expressão
entre as mais lindas da língua portuguesa
subtraia as histórias dos mortos
principalmente se continuam vivos
as fotos mostram os escombros
e o corpo dos bombeiros bem servido
de fardas e esforços pra ajudar a humanidade
subtraia a granola
que eu como com leite enquanto leio
a notícia de tragédia
já fomos melhores em tragédia
houve um tempo em que se arrancavam os olhos
e os corvos comiam teu fígado
até o fim da eternidade
se você ousasse trazer o fogo
pros outros
agora comemora
a ocupação militar em favelas
no rio de janeiro junto às pedras
mudas do viaduto de calcutá
um desconto no carro zero
não que eu seja saudosista
de um tempo mítico desconhecido
desde o começo dos tempos, dizem,
cai um viaduto por dia
no mundo
passo o café pensando nos indianos
e na ocupação militar das favelas
e tentando esquecer do carro
zero
passo o café pensando
em pôr bombas nas redações
dos grupos empresariais
que se entrincheiram nos maiores jornais
comerciais do país
pra que a notícia caia na boca
do povo:
todo dia cai um poderoso
sábado, 2 de março de 2013
tem um vulcão
no coração de cada criança
esse afeto que fere
os cãezinhos ao acarinhar
com força aperta
você é o meu amorzinho
e te quebro as patinhas
te machuco o focinho
quando entra em erupção
o coração das criancinhas
salve-se quem puder
pompeia foi fichinha
*
restava uma dúvida
da vida que iria levar
o talo verde na coluna crescendo
criando seiva saudável
até que eu chegasse nos 28 anos
o talo tornando-se enfim
marrom como as árvores grossas
a meio palmo de viverem
trezentos anos mais que a gente
a menos que caiam, trezentas
árvores tombaram em são paulo
na semana passada, e cortaram a luz de todas as casas
menos da minha
*
quando cresce
o coração endurece
a lava esfria
muito ar
no nosso tórax
já estamos aptos
a educar
as criancinhas
*
as árvores
lentamente
como podem
deixam são paulo
minhas raízes
antes aéreas
se fincam na terra
daqui ninguém me tira
uma nuvem
assombra a cidade
as crianças são frutos
que apodrecem
no coração de cada criança
esse afeto que fere
os cãezinhos ao acarinhar
com força aperta
você é o meu amorzinho
e te quebro as patinhas
te machuco o focinho
quando entra em erupção
o coração das criancinhas
salve-se quem puder
pompeia foi fichinha
*
restava uma dúvida
da vida que iria levar
o talo verde na coluna crescendo
criando seiva saudável
até que eu chegasse nos 28 anos
o talo tornando-se enfim
marrom como as árvores grossas
a meio palmo de viverem
trezentos anos mais que a gente
a menos que caiam, trezentas
árvores tombaram em são paulo
na semana passada, e cortaram a luz de todas as casas
menos da minha
*
quando cresce
o coração endurece
a lava esfria
muito ar
no nosso tórax
já estamos aptos
a educar
as criancinhas
*
as árvores
lentamente
como podem
deixam são paulo
minhas raízes
antes aéreas
se fincam na terra
daqui ninguém me tira
uma nuvem
assombra a cidade
as crianças são frutos
que apodrecem
quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013
fotos de poetas
tem piada
o preto e branco
olho solene
se me fotografassem
também eu não diria
na cara granulada
o que escrevo
*
passava muito
demais
tempo
olhando a sylvia plath
nos anos cinquenta
*
se fôssemos músicos
em tv e internet
amy winehouse presa no tráfego
vinte fotógrafos crápulas na sua cola
ela só queria um cigarro
mamilo do jim morrison
se ainda tenho tempo
morrer intensamente e jovem
na poesia que bobagem
*
aprender a quebrar versos
vendo fotos de poetas
vinte e oito centavos cada uma
as rugas nas retinas
até dos suicidas
além da letra não diz
carne quebrada na imagem
mesmo solene a palavra
é que brilha
o preto e branco
olho solene
se me fotografassem
também eu não diria
na cara granulada
o que escrevo
*
passava muito
demais
tempo
olhando a sylvia plath
nos anos cinquenta
*
se fôssemos músicos
em tv e internet
amy winehouse presa no tráfego
vinte fotógrafos crápulas na sua cola
ela só queria um cigarro
mamilo do jim morrison
se ainda tenho tempo
morrer intensamente e jovem
na poesia que bobagem
*
aprender a quebrar versos
vendo fotos de poetas
vinte e oito centavos cada uma
as rugas nas retinas
até dos suicidas
além da letra não diz
carne quebrada na imagem
mesmo solene a palavra
é que brilha
diário do herói
depois
de grandes aventuras
contra a conta corrente
nosso herói
ofega a queda-d'água
cairão as paredes
um enxame de pessoas
correrá atrás dele
sem a cinta-liga
da justiça
portanto nu
porém vestido
nosso herói
não é de nada
nem de ninguém
a liberdade
é uma capa vermelha
no jardim da infância
uma capa amarela
na adolescência
uma capa de látex
na idade madura
sua vontade fede
a liberdade
defrontado
com malvados vigaristas
a família, o governo, os turistas
nosso herói
corta mato densa selva
arranca as unhas roídas
pela fuga dos cipós
encontra uma macaca chita
e chora as pitangas
desequilíbrio galho em galho
nós, primatas sem rabo
terça-feira, 26 de fevereiro de 2013
quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013
tudo ao mesmo tempo agora
queria achar um jeito
de perder a cachola
sem dar tiro no peito
sem levar a viola
e desfazer as malas
as cartas marcadas
sem nem dizer adeus
chegar no ponto de ir embora
levar bilhete e o pranto
de quem fica e não chora
ficar no mesmo canto
me esquecendo mundo afora
pular de um prédio alto
voar como um macaco
sem noite e sem luz
de pés descalços
ser sempre um não ser
sem hora certa, sem demora
ter tudo e não ter
tudo ao mesmo tempo agora
de perder a cachola
sem dar tiro no peito
sem levar a viola
e desfazer as malas
as cartas marcadas
sem nem dizer adeus
chegar no ponto de ir embora
levar bilhete e o pranto
de quem fica e não chora
ficar no mesmo canto
me esquecendo mundo afora
pular de um prédio alto
voar como um macaco
sem noite e sem luz
de pés descalços
ser sempre um não ser
sem hora certa, sem demora
ter tudo e não ter
tudo ao mesmo tempo agora
segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013
Ele diz com todas as palavras que o proletariado espera pelo menos três serviços dos intelectuais e, portanto, dos artistas: a) que desintegrem a ideologia burguesa (nos dois sentidos: cair fora e denunciar, criticar até reduzir a pó); b) que estudem, compreendam, expliquem e exponham artisticamente, sempre de maneira crítica, as forças que movem o mundo e c) que façam a teoria e a arte avançarem na direção dos seus interesses.
http://www.brasildefato.com.br/content/%E2%80%9Cintelectuais-t%C3%AAm-pavor-de-revolu%C3%A7%C3%A3o%E2%80%9D
http://www.brasildefato.com.br/content/%E2%80%9Cintelectuais-t%C3%AAm-pavor-de-revolu%C3%A7%C3%A3o%E2%80%9D
Cuando piense en gente hecha mierda diariamente
debo pensar también en la velocidad que se acumula
en las puertas de las villas,
en los barcos piratas que los niños contruyen
con las hojas de sus cuadernos
de gramática
Cuando piense en cárcel y escriba cárcel hasta la saciedad,
no olvidarme de anotar en una esquina
manos sobre genitales,
reconocimiento,
confidencias.
(Roberto Bolaño)
debo pensar también en la velocidad que se acumula
en las puertas de las villas,
en los barcos piratas que los niños contruyen
con las hojas de sus cuadernos
de gramática
Cuando piense en cárcel y escriba cárcel hasta la saciedad,
no olvidarme de anotar en una esquina
manos sobre genitales,
reconocimiento,
confidencias.
(Roberto Bolaño)
terça-feira, 5 de fevereiro de 2013
quando imagina que invadem
naves alienígenas o corpo preparado com carinho
a mãe passou talquinho
a vida pôs as fraldas
caminho sem sinais de perda ou fim
não se anuncia o fim tão cedo
dias e noites sucedem
sem que nada cheire estranho
ameaça raios que atinja
não espera que aconteça
mate a mãe e os vizinhos
se o planeta cinde em dois
só pode ser coisa da sua cabeça
naves alienígenas o corpo preparado com carinho
a mãe passou talquinho
a vida pôs as fraldas
caminho sem sinais de perda ou fim
não se anuncia o fim tão cedo
dias e noites sucedem
sem que nada cheire estranho
ameaça raios que atinja
não espera que aconteça
mate a mãe e os vizinhos
se o planeta cinde em dois
só pode ser coisa da sua cabeça
sábado, 2 de fevereiro de 2013
Um dente terrível se anuncia na sala
sozinho não morde nada. Tem dentes o dente
uma boca afiada corta a pele
borrachuda dos lábios perto, o dente cobre
cárie toda a cidade se curva os cachorros
do mato invadem berçários, mordida
de espera aguarda os pedaços, os médicos
dão de ração às bocas os filhos - vivos
quem foge
quem morde
Meninas, vão para os seus quartos
A mãe ciosa prepara os doces
Viemos aqui em busca da carne
Protege as filhas que nem cria
Guardadas pra que não sejam mordidas
Tremem no quarto abraçadas, silêncio
Meu marido vai chegar a qualquer momento
O espartilho expande ventre inteiro
O dente - canino - rasga-a ao meio
sozinho não morde nada. Tem dentes o dente
uma boca afiada corta a pele
borrachuda dos lábios perto, o dente cobre
cárie toda a cidade se curva os cachorros
do mato invadem berçários, mordida
de espera aguarda os pedaços, os médicos
dão de ração às bocas os filhos - vivos
quem foge
quem morde
Meninas, vão para os seus quartos
A mãe ciosa prepara os doces
Viemos aqui em busca da carne
Protege as filhas que nem cria
Guardadas pra que não sejam mordidas
Tremem no quarto abraçadas, silêncio
Meu marido vai chegar a qualquer momento
O espartilho expande ventre inteiro
O dente - canino - rasga-a ao meio
sexta-feira, 25 de janeiro de 2013
Segundo a observação de H. von Stein, ao ouvir a palavra "natureza", o homem dos séculos XVII e XVIII pensa imediatamente no firmamento; o do século XIX pensa em uma paisagem.
(Raízes do Brasil)
*
o céu é que serve
de horizonte quando ao seu lado
os lobos ainda ameaçam
depois domesticada a gente passa
a não ver mais estrelas
*
a constelação de ema
é comida pelo escorpião
lei do antropófago europeu:
só interessa o que é meu
*
um europeu pergunta ao outro
porque deus não fez nos céus
perfeitas formas e tecidos
com as estrelas ao acaso
assim dispostas até parece
que deus não existe
o outro europeu responde
que se deus assim dispôs
é porque tinha um bom motivo
*
(Raízes do Brasil)
*
o céu é que serve
de horizonte quando ao seu lado
os lobos ainda ameaçam
depois domesticada a gente passa
a não ver mais estrelas
*
a constelação de ema
é comida pelo escorpião
lei do antropófago europeu:
só interessa o que é meu
*
um europeu pergunta ao outro
porque deus não fez nos céus
perfeitas formas e tecidos
com as estrelas ao acaso
assim dispostas até parece
que deus não existe
o outro europeu responde
que se deus assim dispôs
é porque tinha um bom motivo
*
quinta-feira, 24 de janeiro de 2013
quem diz macacos
me mordam
deve atentar que essa frase
de infância chama os espíritos
dos macacos, que, por sua vez,
chamam os macacos vivos
o butantã, lar do famoso serpentário,
corre o risco de ser invadido
por um exército de macacos
doidos pra morder
o atrevido
ii
tem os dentes
fossilizados
e tem aqueles
desfeitos erosão
pela memória
cuidado
iii
tem os dentes
da caveira
e tem aqueles
sorrindo na foto
do meu pai
são os mesmos
dos dentes se aprende
(que é que eu aprendo?)
mastigo um pedaço
de queijo no almoço
tudo o que eu mastigo está morto
iv
dos dentes se aprende
quem caça sem dúvida
sobrevivência garantida
pelo bote da mandíbula
meus avós guardam na pia
numa caneca quebrada
fazem poupança com a aposentadoria
mas já não esperam mais nada
v
nestes tempos de epidemia
não conte com a antropofagia
nestes tempos de contaminação
não confie só na digestão
nestes tempos de sobreaviso
não morda nem seu amigo
vi
nestes tempos autoimunes
os galhos tremem
os micos têm medo
e fome, mas só ficam assistindo
o bairro espera
o novo ataque
treme à espreita
das suas feras
são outros dentes que mordem
o interior das bochechas
me mordam
deve atentar que essa frase
de infância chama os espíritos
dos macacos, que, por sua vez,
chamam os macacos vivos
o butantã, lar do famoso serpentário,
corre o risco de ser invadido
por um exército de macacos
doidos pra morder
o atrevido
ii
tem os dentes
fossilizados
e tem aqueles
desfeitos erosão
pela memória
cuidado
iii
tem os dentes
da caveira
e tem aqueles
sorrindo na foto
do meu pai
são os mesmos
dos dentes se aprende
(que é que eu aprendo?)
mastigo um pedaço
de queijo no almoço
tudo o que eu mastigo está morto
iv
dos dentes se aprende
quem caça sem dúvida
sobrevivência garantida
pelo bote da mandíbula
meus avós guardam na pia
numa caneca quebrada
fazem poupança com a aposentadoria
mas já não esperam mais nada
v
nestes tempos de epidemia
não conte com a antropofagia
nestes tempos de contaminação
não confie só na digestão
nestes tempos de sobreaviso
não morda nem seu amigo
vi
nestes tempos autoimunes
os galhos tremem
os micos têm medo
e fome, mas só ficam assistindo
o bairro espera
o novo ataque
treme à espreita
das suas feras
são outros dentes que mordem
o interior das bochechas
quinta-feira, 17 de janeiro de 2013
o dia que eu for escritor
minha mãe vai contar
às amigas o marcos
ganhou prêmios elas vão dizer
cejuraquelegal
deus me livre do dia em que eu ganhe prêmios
avolumando-se as consumidoras na garganta dos livreiros
e o mundo igual do mesmo jeito
me perguntam da arte da fome do brasil e eu vou dizer
bobagens publicadas minha mãe vai contar
às amigas o marcos saiu
até no jornal
deus me livre de um dia sair no jornal
ii
vimos
por meio desta
comunicar-lhe apesar
das evidentes qualidades literárias
decidimos não publicar seu livro
boa sorte
boa noite
seu livro foi selecionado
parabéns
entre milhares de outros
e agora queremos
dar ao mundo essa obra
de extremo bom gosto
você tem interesse em publicar conosco?
iii
tudo que eu escrevo
é poema, menos isto
trata-se de reza
a céu aberto
eu e as evangélicas
gostamos de rezar
bem alto na porta
às amigas o marcos
ganhou prêmios elas vão dizer
cejuraquelegal
deus me livre do dia em que eu ganhe prêmios
avolumando-se as consumidoras na garganta dos livreiros
e o mundo igual do mesmo jeito
me perguntam da arte da fome do brasil e eu vou dizer
bobagens publicadas minha mãe vai contar
às amigas o marcos saiu
até no jornal
deus me livre de um dia sair no jornal
ii
vimos
por meio desta
comunicar-lhe apesar
das evidentes qualidades literárias
decidimos não publicar seu livro
boa sorte
boa noite
seu livro foi selecionado
parabéns
entre milhares de outros
e agora queremos
dar ao mundo essa obra
de extremo bom gosto
você tem interesse em publicar conosco?
iii
tudo que eu escrevo
é poema, menos isto
trata-se de reza
a céu aberto
eu e as evangélicas
gostamos de rezar
bem alto na porta
quinta-feira, 10 de janeiro de 2013
um encontro estala atrás
do poste de luz da esquina
te disse que está lá atrás os guardas
o levam dali para a jaula o encontro
era um javali
órfão porque no escuro
da metrópole
ii
um naco de vidro que prende na garganta
um pote de abacate que caiu e se quebrou
a língua alcança os dedos e neles tinha vidro
e tinha o abacate amassado com açúcar
agora sinto sangue descendo pelo esôfago
agora desacomoda e o vidro ainda está ali
iii
o encontro também
pode ser?
uma praia aonde eu não vou
o cós das calças que eu não sei
uma queda bem distante
a intransigência de alguém
os futuros carcomidos
pelo vento do passado
o passado afogado
na enxurrada do futuro
maduro maduro
monturo
iv
hoje
exploraremos
o encontro
do rio negro
consigo mesmo
as águas
as algas
amalgamam
a história
do curso
que deságua
não seguiremos
nós parados
neste exato
corrente
momento
v
prometo pensar o imediato
porque me perco se distraio
perseguindo umas palavras
que não têm lastro então eu penso
nestes dentes todos juntos
o encontro seria
só meu se eu fosse
um destes dentes
eu nem ia ligar
eu, enquanto dente,
encontrado que estaria
no desgaste que mastiga
vi
esta
é a história
de quando a história não sabe
de si
do poste de luz da esquina
te disse que está lá atrás os guardas
o levam dali para a jaula o encontro
era um javali
órfão porque no escuro
da metrópole
ii
um naco de vidro que prende na garganta
um pote de abacate que caiu e se quebrou
a língua alcança os dedos e neles tinha vidro
e tinha o abacate amassado com açúcar
agora sinto sangue descendo pelo esôfago
agora desacomoda e o vidro ainda está ali
iii
o encontro também
pode ser?
uma praia aonde eu não vou
o cós das calças que eu não sei
uma queda bem distante
a intransigência de alguém
os futuros carcomidos
pelo vento do passado
o passado afogado
na enxurrada do futuro
maduro maduro
monturo
iv
hoje
exploraremos
o encontro
do rio negro
consigo mesmo
as águas
as algas
amalgamam
a história
do curso
que deságua
não seguiremos
nós parados
neste exato
corrente
momento
v
prometo pensar o imediato
porque me perco se distraio
perseguindo umas palavras
que não têm lastro então eu penso
nestes dentes todos juntos
o encontro seria
só meu se eu fosse
um destes dentes
eu nem ia ligar
eu, enquanto dente,
encontrado que estaria
no desgaste que mastiga
vi
esta
é a história
de quando a história não sabe
de si
sábado, 5 de janeiro de 2013
novo
às vezes
o ano
cai de repente
outras vezes
ele entra
suave
este ano
parece
ainda está na barriga
de dezembro
ii
ingrato
depois de tudo
em 2012
vai dizer que não quer
2013
que pose
iii
às vezes
quem entra
no ano é você
outras vezes nem
isso
iv
variações
monótonas
precárias
sobre um mesmo tema
2011
2012
2013
v
resoluções de ano novo
desistir de ser poeta
entrar pro clube de remo
comer menos
(não necessariamente
nessa ordem)
vi
resoluções para 2013
escrever algo que preste
reinventar a rima fácil
jogá-la pelo ralo
escrever o imprestável
vii
segunda lista
de resoluções
querida mãe
persistir na análise
let's start a magazine
viii
pendurar uma placa
no pescoço na porta
contenha-me
viiiiiiiiiii
o ano
cai de repente
outras vezes
ele entra
suave
este ano
parece
ainda está na barriga
de dezembro
ii
ingrato
depois de tudo
em 2012
vai dizer que não quer
2013
que pose
iii
às vezes
quem entra
no ano é você
outras vezes nem
isso
iv
variações
monótonas
precárias
sobre um mesmo tema
2011
2012
2013
v
resoluções de ano novo
desistir de ser poeta
entrar pro clube de remo
comer menos
(não necessariamente
nessa ordem)
vi
resoluções para 2013
escrever algo que preste
reinventar a rima fácil
jogá-la pelo ralo
escrever o imprestável
vii
segunda lista
de resoluções
querida mãe
persistir na análise
let's start a magazine
viii
pendurar uma placa
no pescoço na porta
contenha-me
viiiiiiiiiii
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