Agora eu não sei o que faço com ele.
Uma faixa vermelha pinga da testa. Pá, serrote, noticiário, já vi tudo. Ela encara o corpo gordo do marido morto. "Muito, muito mais gordo". Devia ter brigado ainda mais com ele: pra que emagrecesse, e então ela o carregaria que nem saco de pão para o resto da vida. "Comer?". A ideia lhe deu nojo. Se você mata alguém e isso não estava previsto, quero dizer, se você não planejou muito bem antes, vamos admitir que é uma estupidez, embora seja impulso, não deu pra controlar, embora o controle também seja estúpido, mais esta, a vida não tem receita para nada. Também não o assassinato. Uma faca escorrega, o bolo não cresce, a massa desanda. Então é pensar - pense, pense - refazer tudo daqui pra frente e tentar - tente! - não cair nas garras da polícia.
Foi aí que ela se lembrou dos porcos.
"Porco come até osso", foi o marido quem disse. Ele gostava de colecionar histórias de crime. Se soubesse como morreu, ficaria muito animado. Mas não saberia, mesmo que vivesse. Olha os porcos! Ela gasta uma caixa inteira de lenços umedecidos pra limpar embaixo das unhas, as solas dos sapatos, o suor dos suvacos, o sangue coagulado. E fica olhando a vara, a pocilga, o persigal, festim, os guinchos se refestelando. Não sei se ela sente remorso, tristeza, vingança. Se está feliz? Os porcos estão? Só acontece o que acontece. Tipo essa náusea que ela agora sente, e entra no carro antes que vomite, vai embora. O cheiro, imagine. Ela já nem teria como se limpar.
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